quarta-feira, 29 de abril de 2009

Mesa de café com tabela periódica

Essa é uma fusão bem interessante de um móvel doméstico com um motivo químico. Ficaria muito bem em um Instituto de Química.

http://www.element-collection.com/html/coffee_table.html

quinta-feira, 9 de abril de 2009

Rutherford, Borh e Ariano Suassuna

Qual a relação entre os modelos atômicos de Ernest Rutherford, de Niels Borh e o estilo de música punk ou funk ou qualquer outra coisa parecida ou não parecida? Bem, difícil dizer. Quem levantou a questão foi um grande amigo meu, quem também é químico, dono do blog GYPF que aborda música e cultura em geral. Ele consegue encontrar pérolas da música. Ele encontrou esse vídeo, que também é uma pérola, envolvendo um dos maiores dramaturgos do Brasil e defensores da cultura nordestina: Ariano Suassuna. Ele fala do caso de um rapaz que tentou convercê-lo de que a música nordestina não está com nada. Assista e tire as suas conclusões.

domingo, 5 de abril de 2009

Como transformar vinho barato em vinho caro em minutos

"E agora Mister M? Principe negro de todos os sortilégios. Oh, paladino Mascarado, como é que você vai sair dessa? " Sid Moreira.

Esse é um caso bastante interessante que mesmo com respaldo de experimentos científicos e uma visão parcial algo possa ser possível. Apresento e discuto aqui um artigo que descreve um método de maturação de vinho barato em um vinho de sabor e complexidade comparável a um de alta qualidade em alguns minutos. É sabido que um vinho leva anos até atingir a complexidade desejada sob condições controladas de temperatura, luminosidade, oxigenação, movimentação das garrafas e outras. Há uma magia no processo de envelhecimento, uma tradição de anos que agora tem sua necessidade questionada. O método funciona? Os dados são verdadeiros? Segue abaixo um resumo do artigo para aqueles que não possuem acesso aos jornais científicos. Longe de ser o Mr. M, faço a minha avaliação como químico analítico.

Resumo do artigo

Resumo

O artigo de Zeng e colaboradores [1] descreve um método de maturação de vinho barato e de baixa complexidade controlando um campo elétrico alternado e o tempo de permanência dentro do sistema. A eficiência do método foi suportada por análises químicas (HPLC e CG/MS) dos componentes mais importantes e provas as cegas com provadores com experiência e tomando um vinho de qualidade como referência. Os resultados mostraram uma diminuição nos aldeídos e no etanol e um aumento nos ésteres e amino-ácidos e os outros compostos mantiveram-se comparáveis. Foram feitos experimentos variando o campo elétrico em 0, 300, 600 e 900V/cm e o tempo de tratamento em 0, 1, 3 e 8 minutos. A melhor condição foi 600V/cm durante 3 minutos.

O método

O vinho foi passado por uma serpentina feita de tubos de teflon de 2mm de diâmetro externo em formato de U interconectados. Essa serpentina foi mantida entre duas placas planas feitas de titânio, espaçadas de 20cm, que formam os eletrodos onde se aplicou uma tensão elétrica alternada de 3kHz e com potencial ajustável até 30kV. Isso possibilitou a aplicação de um campo elétrico alternado até 1500V/cm. O sistema de bombeamento do vinho através da serpentina possui fluxo controlado. Não ouve termostatização da temperatura pela baixa geração de calor devido ao campo elétrico.

A amostra de vinho

Foi usado o vinho Young Cabernet Sauvignon da Suntime Winery Company, região noroeste da China, Xingjiang, três meses após a fermentação malolática. Para cada experimento foram usados 50L.

As análises

Foram efetuados experimentos respeitando os protocolos adotados nas análises de vinhos e recomendados pelos O.I.V. (1990) e A.O.A.C. (1995). Os ácidos orgânicos foram quantificados por HPLC, os açúcares totais e o ácido acético foram analisados por titulação. Cada medida foi feita três vezes com significância estatística de p<0,05 href="http://en.wikipedia.org/wiki/ANOVA">ANOVA.

Também foi feita uma avaliação sensorial com 12 provadores com experiência usando todos os vinhos tratados em todas as condições citadas: 0, 300, 600 e 900V/cm e o tempo de tratamento em 0, 1, 3 e 8 minutos. Foram avaliado parâmetros como: claridade, cor, aroma, gosto e equilíbrio.

Resultados

Variação nas concentrações

As percentagens seguintes correspondem às variações nas concentrações na condição ótima de tratamento do vinho (600V/cm durante 3 minutos) em relação ao vinho antes do tratamento (0V/cm durante 0 minutos). Esses valores não se encontram no artigo mas foram obtidas a partir da tabela 1 do artigo. Sinal positivo indica aumento na concentração e negativo significa diminuição. O número entre parenteses é o desvio relativo obtido por cálculo simplificado de propagação de erros. Nota: eu não posso colocar as figuras e tabelas dos dados do artigo aqui pois elas possuem direitos autorais sendo necessário uma autorização. Também coloquei somente a condição ótima e a inicial para simplificar o entendimento. Maiores detalhes, consulte o artigo.

Etanol: -0,848(0,003)%
Açúcares total: 0(0)%
ácido volátil (ácido acético): 0(0)%
Acidez total: -2,173(0,016)%
Extrato seco: 0(0)%
Amino ácidos livres: +2,11(0,02)%
Álcoois de cadeia maior: -23(2)%
álcool beta-feniletil: +2,00(0,11)%
etil succinato: +11,3(0,8)%
dietil succinato: +4,7(0,5)%
etil lactato: +1,16(0,07)%
aldeidos: -25(3)%

Obs.: Álcoois de cadeia longa no vinho são normalmente n-propanol, isobutanol (2-metil-1-butanol), álcool iso-amílico (3-metil-1-butanol) e álcool amílico (2-metil-1-butanol).

Avaliação sensorial

A avaliação sensorial foi feita por 12 provadores com experiência. Comparando os dados do vinho sem o tratamento e com a melhor condição de tratamento (tabela 2 do artigo), observa-se as seguintes variações:

Claridade (total 10): 8,0 para 8,0.
Cor (total 10): 7,5 para 8,0.
Aroma (total 30): 20,0 para 25,5.
Sabor (total 40): 28,0 para 35,0.
Equilíbrio (total 10): 7,0 para 8,5.
Total (total 100): 70,5 para 85,0.

Conclusões do artigo

A melhor condição encontrada de maturação para o vinho foi de 600V/cm durante 3 minutos.

Foi observado redução na quantidade dos álcoois de cadeia longa e aldeidos e aumento na quantidade de amino ácidos e ésteres. Os outros componentes permaneceram praticamente inalterados.

A avaliação sensorial mostrou um aumento de 70,5 para 85,0 na pontuação total. Campos elétricos alternando de valor maior que 600V/cm e tempos de tratamento maiores que 3 minutos promovem um gosto de queimado no vinho.


Minha discussão

Teste sensorial

No teste sensorial as cegas com os provadores foi obtido um valor de 8.0 (de um total de 10) para todas as faixas de tratamento do vinho do quesito claridade. Já no quesito cor cinco condições permaneceram inalterados em 7,5 e nas outras quatro condições houve apenas um aumento de 7,5 para 8,0. Logo, a claridade do vinho, visualmente, não sofreu interferência e a cor praticamente não mudou. Esse teste não tem valor analítico e estão sujeitos à subjetividade e à fadiga dos olhos. Caberia aqui um experimento de espectrofotometria para verificar a variação na concentração das espécies que absorvem luz.

Polifenois

O vinho possui mais coisas além de água, açúcares, amino-ácidos, ésteres e álcoois. O artigo não falou absolutamente nada sobre uma das classes mais importantes do vinho durante o processo de maturação: os polifenois. São estruturas complexas com anéis aromáticos. No vinho, os principais são os tantinos e as antocianinas.

Os taninos são encontrados nas cascas, talos e sementes da uva. São eles que mancham os dentes, roupas e secam a boca. Eles conferem o característico sabor adstringente (dai vem o nome tânico) devido à precipitação das enzimas da saliva (amilase) por mudança de pH e complexação. Há dois tipos de taninos: hidrolisáveis e condensados. O vinho apresenta os taninos condensados que também são chamados de flavona ou protocianidinas. Podem variar de 2 a 50 ou mais unidades e possuem vários grupos hidroxilas que confere forte poder complexante com proteinas. São os responsáveis pelo aumento da complexidade do vinho por fazerem o papel de reticulação entre as moléculas. Apesar dos taninos serem hidrosolúveis, os taninos de alto peso molecular chegam a precipitar gerando o corpo de fundo. Os taninos condensados também são chamados de proto-antocianidinas. Possuem propriedades anticéptica e anti-oxidante que faz o vinho ser conservado por mais tempo dentro da garrafa, desde de que não entre quantidade significativa de oxigênio. Na antiguidade, o vinho era considerado mais "limpo" que a água (devido às condições de higiene de antigamente) e era usado para limpar ferimentos. Soldados romanos tinham uma garrafa de vinho para lavar os cortes e aliviar a dor pela embriagues. Se a concentração de gás oxigênio dissolvido no vinho aumentar (rolha seca e rachada) irá oxidar os álcoois (não somente etanol) gerando aldeídos. São os aldeídos que geram dor de cabeça. Em casos extremos de oxigênio, o vinho vira vinagre pela conversão dos aldeídos em ácidos carboxílicos. Portanto, a garrafa dever permanecer com a rolha para baixo para se manter entumecida e evitar a entrada de oxigênio. O processo de maturação deve ocorrer com um mínimo de oxigênio (é impossível estar totalmente livre dele).

As antocianinas conferem propriedades anti-oxidantes por terem estruturas aromáticas com elétrons desemparelhados que também apresentam forte absorvância. Detalhe: absorção de luz se refere ao fenômeno físico e absorvância ou absorbância ou absorviência se refere à quantificação da absorção de luz. Podem apresentar cores como vermelho, azul ou violeta de acordo com o pH. Com o passar do tempo vão ocorrendo as polimerizações dos polifenois deixando o vinho com um sabor mais complexo e suave. Vinho com alto grau de antocianinas apresentam corpo de fundo. As antocianidinas são as antocianinas sem açúcares em sua estrutura. Logo, durante o processo de envelhecimento do vinho, ocorre a condensação dos taninos gerando antocianinas e antocianidinas. Ainda pode ocorrer condensações entre essas duas estruturas gerando estruturas ainda mais complexas.

Minhas conclusões

O artigo é incompleto na tentativa de mostrar a eficiência do método por mostrar parte da composição do vinho. Em nenhum momento é mencionado os polifenóis. O vinho não é somente água, álcool, açúcar, aminoácidos, ésteres e aldeidos. Acredito que os dados analíticos são verdadeiros e coerentes para esses compostos. No entanto, foi apresentada uma visão parcial.

O método descrito no artigo por Zeng e colaboradores NÃO é conclusivo em promover a maturação de vinhos. Apesar de não terem sido feitos experimentos de determinação da quantidade de taninos e antocianinas por método cromatográfico e nem espectrofotometrico, pode-se concluir isso pela claridade e pela cor do vinho que se mantiveram praticamente inalterados (tabela 2 do artigo) nos testes sensoriais para todas as combinações de condições experimentais de campo elétrico e tempo de tratamento. A cor está associada com os taninos e as antocianinas do vinho. Também não foram feitos experimentos com um vinho de qualidade atestada para comparação.

Os dados do artigo provam também o quanto é questionável a avaliação humana usando os sentidos de visão, olfato e paladar. O ser humano possui subjetividade e sofre fadiga. Seus sentidos não são capazes de separar cada composto do vinho, mas respondem como um todo apesar de apresentarem seletividade. O sentido de visão não possui um prisma ou rede de difração, o olfato não possui um cromatógramo a gás e o paladar não possui um cromatógramo líquido. As notas são critérios claramente qualitativos. Deixando claro, em nenhum momento eles, os provadores, deveriam dizer se tinha ou não e qual era a concentração de taninos e antocianinas nas amostras de vinho. A função deles era dizer se o vinho ficou melhor após o tratamento. No entanto, de fato, dentro da faixa perceptível da visão humana, os testes sensoriais nos deram a pista para descobrir que o método de campo elétrico alternado de Zen e colaboradores não tem sua eficiencia atestada. Logo, não houve mudança significativa dos taninos e das antocianinas e chama a atenção para esse ponto não abordado no artigo.

"Boa noite." Sid Moreira.

Referência

[1] Xin An Zeng, Shu Juan Yu, Lu Zhang, Xiao Dong Chen, "The Effects of AC electric field on wine maturation", Innovative Food Science and Emerging Technologies, 2008, 9, 463-468.
DOI
http://dx.doi.org/10.1016/j.ifset.2008.03.002

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